segunda-feira, 14 de maio de 2012

Comboios II



Vou de viagem.
E por mais bagagem que eu leve, mais ainda cabe na minha sacola.
Não sei qual tempo é meu ou qual espaço me cabe.
Só sei que estou vivo e participo.

Eu, mais uma horda de moleques,
A atirar pedras e correr por cima dos muros.
Todos sujos de infância.
Num tempo que não havia treta e todo mundo era rei.

Ê boi, ê boi da cara preta, pega esse menino,
Traz pra desfilar pela avenida,
Com o pé descalço e o samba na ponta da língua.

A banda passa e eu sigo.

Que venham a mim todos os bancos de praça,
Todas as moças esperando nas janelas,
os amores clandestinos,
Todos os becos escuros em que se faz escondido.

Venham até mim os desajustados,
Os que não se encaixam nos padrões.
Que chegue a mim o fogo de todas as paixões;
Venham ter comigo em comunhão.

Eu tenho o sentimento urgente,
A vontade maior
De fazer mais.
Por você, por mim.
De ser gente.
E ser tudo.
O que o mar traz a praia
e o que calmamente descansa em seu fundo.
Por isso, antes de morrer, flutuo.

A espuma do tempo e a existência ascética.
O lado oculto da lua e o que eu desconheço de mim.
O que mais devo levar, se existir é apenas crer?

Danço, porque ouço a música.
Afinal,
O que é carnaval e o que é vida, senão a mesma coisa?

Maravilha.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Comboios


Boiam na água, na cara do poço, meus sentimentos.
Qual tecido recortado, deitado fora por não servir à roupa.
Por não vestir ninguém.

Não sei mais a parte que me cabe nesse sentir tudo.
Não sei.
Deveras não sei distinguir o que há de errado comigo.
Quiçá saberei o que te aconteceu, ó mundo, vasto mundo.
Pobre de mim, que não me chamo Raimundo.
Que não sei rimar ou emprestar sentido ao que é meu.
Pobre de mim, que não sou daqui.

Tudo que eu quis, ou foi pouco ou sobrou.
E hoje, não há nada que eu queira mais
do que saudar o que ainda não vivi.

Abre a janela menina, abre a janela.
O que você vê, reflete aquilo que você é.
Abre a janela, eu imploro.
Vem te ver.
Tenho fé, menina, por isso escrevo.
Tenho a boca seca, os olhos grandes e algum vazio.


Preciso falar para não endurecer:
Não deixe pra trás, não desista.
Pegue o que é teu.
É o que vale amiga.
O resto é o que pode ter sido, que não é.
O resto é um querer descabido,
uma vontade matreira de te fazer aquém.

Já fomos tudo, outrora, já somos um.
Sigamos juntos, o peito aberto e o olhar noturno.
Caminhemos por mais caminhos do que nossos pés alcancem.
Sintamos o gosto da fruta e a luz da vida na semente.
Voemos alto, por fim, voemos.
Há metafísica bastante em não ter parte com tudo isso.

Tudo que passa.
Tudo que pára as massas.
Tudo que amassa e apodrece as maçãs.
Não é digno de amor.
Não se pode levar pra cama,
Nem dar lugar no esplendor.

Põe mais comida à mesa farta.
Põe mais pretensão divina nas igrejas.
Faça isso de modo que te torne grande e sublime.
Faça isso porque não há nada mais que mude ou altere:
A palavra dita, a flecha lançada e a matéria inerte.

Há mais revolução na mesa de um bar,
Do que em baixo dos pelos, dos peitos,
Das camisas dos jovens alheios.
Com os dedos em riste, fazendo algazarra e farra com o blá,blá,blá dos livros.
Há quem duvide e há quem faça.
O olhar é que os distingue.

Me dê absolvição, ó mestre, não sei o que falo.
Perdoa o cancioneiro errante, o cantador caduco, a sinfonia finda.
Perdoa o infante, estrada afora, sem saber pra onde vai ou de onde vem.
Perdoa a mim, que deixei no espelho d´água tudo aquilo que senti e não sei.









quinta-feira, 3 de maio de 2012


O que está de portas fechadas e ele entra.


O que está posto e ele o contrário.


O que está na alma, à mesa posta, o vinho tinto.


O homem forte, parado na esquina da vida, pensava em quê?


O homem de músculos a pino, na intersecção do caminho.


O homem fora da caixa pensava não haver contexto.


Pensava em chave, status quo, começo.


O homem à mesa posta escorria vinho tinto.


O homem contrário pensava não haver um jeito.


Pra alma, fora da caixa, porta fechada e ele entra.


O homem parado, visto de cima, o homem recomeço.


O homem tropeço, na esquina da vida, parado.


Pensava em quê?